O doce de leite é um produto muito apreciado em todo o mundo e, especialmente na américa latina. Por esta razão, esta iguaria ganhou um dia só seu, no dia 11 de outubro comemora-se o dia mundial do doce de leite. A origem desta comemoração é incerta e ainda pouco conhecida, porém, temos que concordar que seria muito interessante dedicar uma comemoração ou evento neste dia para homenageá-lo.

Aos meus olhos, a produção de doce de leite é uma arte, e está ligada ao carinho e ao amor. Quando se fala em doce de leite, aquele tradicional, lembro-me da minha avó na roça mexendo um imenso tacho de cobre com uma colher de pau e aquecimento sobre tijolos e lenha. 

Porém, a história do doce de leite se respalda em datas mais antigas.

UM BREVE HISTÓRICO SOBRE O DOCE DE LEITE

Não se sabe ao certo a origem, na verdade existem diferentes versões sobre sua criação. São vários países que a reivindicam, tal como Argentina e Chile. Dessa forma, achei interessante considerar os registros escritos. 

Se tratando de registros bibliográficos, uma referência que data do século XIV cita um produto chamado ‘Manjar Blanco’ feito à base de leite, açúcar e farinha de arroz, que se assemelha às anotações deixadas pelo naturalista Chileno Juan Ignácio Molina, entre os séculos XVIII e XIX, anotações estas consideradas por muitos como um dos primeiros registros escritos sobre o Dulce de Leche (Doce de Leite) na américa.

A difusão do doce de leite pelo Brasil, América Central e Antilhas ocorreu em paralelo com o crescimento na produção de sacarose de cana-de-açúcar, a partir do século XVI e com a prática de sua utilização para conservação do leite.

Em meados do século XIX, depois do sucesso de público e crítica de dois livros de cozinha, “O Cozinheiro Imperial” e “Cozinheiro Nacional”, os dois primeiros deste tipo publicados no Brasil, a editora Garnier resolveu lançar em 1883 um livro voltado exclusivamente para receitas doces, “Doceiro Nacional”, que conquistou rapidamente o gosto das pessoas e ganhou várias edições. É neste livro que encontramos registradas formalmente as primeiras receitas de doce de leite do Brasil, quatro para ser mais exato e, uma delas feita apenas com leite, açúcar e bicarbonato de sódio. 

Um dos estados que se destaca na produção de produtos de laticínios, incluindo o doce de leite, é o estado de Minas Gerais. Historicamente, a recordar do período em que o estado protagonizou a ‘política do café com leite’, o mesmo se destaca como um importante produtor de leite no Brasil. Atualmente, a região Sudeste se mantém como a região com maior volume produzido (444 milhões de litros/ ano), possuindo o estado de Minas Gerais o maior número de fazendas produtoras de leite do Brasil de acordo com o relatório ‘Levantamento Top 100 – 2021’ (site MilkPoint, 2021). 

O COMPLEXO DOCE DE LEITE

Na primeira colherada que damos em um doce de leite pastoso de qualidade, podemos sentir um mundo de aromas, sabores e texturas: doce, lácteo, caramelo, queimado, esfumaçado, fina arenosidade de cristais, fina arenosidade de coalho, cremoso, textura aveludada.

O doce de leite é um produto que possui grande complexidade de sabores, cores e aromas. Os fatores que afetam essas características são os mais variados, podemos citar a qualidade das matérias-primas, o processamento e as tecnologias empregadas para sua produção, a composição do produto, os parâmetros tempo/ temperatura/ pressão/ velocidade de agitação empregados no processo, dentre outros.

Com o passar dos anos, naturalmente, muitas mudanças foram sendo feitas neste produto. De modo que, em cada lar, sítio, roça ou laticínio é produzido um doce de leite diferente, com particularidades únicas. 

Em cada estado brasileiro existem preferências por sabores, texturas e cores específicas. Por exemplo, nos estados localizados ao norte do país, há uma preferência pela cor mais clara ou branca, e a medida que vamos descendo no mapa há uma preferência por cores levemente escuras/amarronzadas, e na região sul cores escuras/marrom caramelizado agradam mais, provavelmente devido a influência dos países vizinhos, Argentina e Uruguai, que são produtores de doces com essas características.

Além disso, o doce de leite possui muitas variações dependendo da localidade que o produz. Na Argentina e Uruguai peça um Dulce de Leche ou, se estiver no México peça uma Cajeta, na Colômbia e Venezuela peça um Arequipe, na França a pedida será Confiture de lait

A DIVERSIDADE DO DOCE DE LEITE NA ATUALIDADE

Atualmente, o doce de leite produzido no Brasil segue o Padrão de Identidade e Qualidade estabelecido pela Portaria n° 354, de 4 de setembro de 1997, do Ministério da Agricultura e Abastecimento com alterações feitas pela Portaria MAPA n° 855, de 27 de setembro de 2010. Nela o doce de leite é definido como o produto, com ou sem adição de outras substâncias alimentícias, obtido por concentração e ação do calor a pressão normal ou reduzida do leite ou leite reconstituído, com ou sem adição de sólidos de origem láctea e/ou creme, e adicionado de sacarose (parcialmente substituída ou não por monossacarídeos e/ ou outros dissacarídeos).

No mercado encontramos doce de leite de diversas formas e formatos, puros ou com adições, pastosos ou em tabletes/barras, cubinhos, com texturas diversas, com formação de crostas, tal como o pingo de leite, embrulhado na palha, acomodados em embalagens plásticas e delicadamente decorados em caixinhas de madeira, na forma de compotas de vidro, potes plásticos, latas, blisters, bags e baldes. Como já destacamos acima, o doce de leite pastoso pode ser comido de colher ou se produzido com um ponto mais puxado ou adicionado de amidos ou hidrocoloides, pode ser utilizado em receitas, padarias e confeitarias.

Encontramos ainda doce de leite tradicional feito somente com leite, açúcar e bicarbonato, doce de leite tipo Argentino e Uruguaio, mais espesso, caramelizado, escuro e, às vezes, com um toque de baunilha, doce de leite com adições de sabores, tal como chocolate, coco, amendoim e ameixa, doce de leite zero lactose (feito para pessoas intolerantes a lactose), doce de leite diet ou reduzido em açúcar ou gordura (adequado para diabéticos e para dietas com restrição de carboidratos), dentre outros. 

COMÉRCIO DO DOCE DE LEITE

O doce de leite é um laticínio de alto valor agregado, largamente consumido como sobremesa e valorizado devido à diversidade de apresentações, versatilidade e características sensoriais agradáveis. Sua baixa umidade permite o armazenamento deste produto em temperatura ambiente por períodos longos, mantendo a segurança e facilitando a logística.  

No Brasil, este produto está presente no dia a dia, sendo distribuído por pequenos e grandes supermercados, utilizados como coberturas e recheios em padarias, servido nos restaurantes espalhados por todo o país, nas paradas à beira da estrada, e assim por diante. Entretanto, no que tange ao comércio internacional, ainda enfrenta alguns gargalos. 

Os principais desafios apresentados para a exportação de produtos lácteos brasileiros, o que inclui o doce de leite, são os preços pouco competitivos, a qualidade do leite ainda fora dos parâmetros internacionais, as políticas públicas que pouco apoiam os produtores de leite e os laticínios, a coordenação da cadeia produtiva que necessita ser mais integrativa entre produtores, fornecedores de insumos, logística de captação e distribuição, indústria de processamento, atacadistas e varejistas, de forma a superar essas barreiras de mercado.

UM CONSELHO AOS CIENTISTAS DE ALIMENTOS

Atuo a mais de 6 anos em uma fábrica de doces de pequeno/médio porte. Nesta empresa, atuando como gerente do controle de qualidade e com pesquisa e desenvolvimento de novos produtos, tenho convicção em dizer que todo conhecimento adquirido durante o meu período acadêmico, para obtenção do título de cientista de alimentos, em algum momento foi utilizado. A química dos alimentos, os princípios de conservação dos alimentos, as ciências sensoriais, a engenharia de processos, os conhecimentos de microbiologia, a pesquisa e o desenvolvimento de produtos, e assim por diante. 

Acredito que muitos cientistas de alimentos que estão no mercado de trabalho irão concordar que, a prática utiliza das teorias aprendidas, mas é muito mais dura, pois o profissional é constantemente cobrado a ter resultados. 

O papel do cientista de alimentos na indústria envolve, em grande parte, a resolução de problemas e a busca por soluções. Acredito que o nosso sucesso seja o fruto, principalmente, de nossa capacidade de resolver problemas. Por isso, o meu conselho é: desenvolva a habilidade de perguntar, saiba buscar as respostas e pratique os seus conhecimentos. Seja um bom líder, mas para ser um bom líder, aprenda a liderar a si mesmo, seja disciplinado (a). Não importa o porte da empresa onde vai trabalhar, saiba que vai ser nesta empresa que irá escrever parte da sua história.

Sobre o autor

Franklin Júnior Moreira da Silva

Graduado como bacharel em Ciência e Tecnologia de Alimentos pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sudeste de Minas Gerais (IFSEMG), Campus Rio Pomba, no ano de 2013. Mestre em Tecnologia de Alimentos pela Faculdade de Engenharia de Alimentos – UNICAMP. Atualmente, atua a mais de 6 anos como Gerente de Controle da Qualidade e Pesquisa e Desenvolvimento na empresa Doces Mirahy.

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